Os Dez Mandamentos do Policial
Toda atividade profissional possui suas características, que expandem
ou limitam os aspectos da vida daquele que se propõe a adotar
determinada profissão. Neste sentido, a atividade policial é um dos
ofícios que mais exige cuidado e adaptação da vida afetiva, familiar e
cotidiana de seus adeptos. Por isso, resolvemos fazer um pequeno guia
para aqueles que não são policiais entenderem essas limitações, e para
os policiais que nos lêem reforçarem ideias que geralmente lhes são
passadas desde o curso de formação.
Os Dez Mandamentos do Policial são ensinamentos para cuidar da
integridade do policial e daqueles que se relacionam com ele fora ou
durante o desempenho de sua atividade profissional:
Policiais que frequentam locais vulneráveis à incidência de crimes
estão se dispondo a correr riscos que podem ter fins trágicos. É claro
que as coisas podem ocorrer em qualquer local, porém, sabemos bem os
bares, lanchonetes e outros estabelecimentos propícios à presença de
pessoas envolvidas com o crime. Não é agradável sentar em uma mesa de
bar ao lado de um suspeito preso em uma ocorrência por você próprio em
outra ocasião. Por isso, independentemente do custo dos lugares que
frequenta, procure sempre estabelecimentos onde a honestidade parece ser
a característica de seu público.
Todos nós possuímos amigos, mas não necessariamente somos
responsáveis pelas suas trajetórias. Assim, é perfeitamente possível que
um amigo de infância enverede pelo ambiente do crime, e que passe a ter
um estilo de vida incondizente com o que um policial pode admitir para
sua própria segurança. Não se trata de “elitismo”, de ter amizades
diferenciadas só por ter se tornado policial. Mas, no mínimo, é preciso
estabelecer limites para alguns tipos de amigos – principalmente aqueles
de ocasião.
Relacionamentos amorosos podem gerar sérios problemas para policiais,
a depender de quem seja a pessoa com quem está se relacionando.
Considerando o fato de que a atração amorosa não é controlada
racionalmente, ou que este controle tem certos limites, é bem possível
que um policial se envolva com pessoas que, por sua personalidade ou
ambiente familiar e de amizades (e até por seus relacionamentos amorosos
anteriores) sejam problemáticas para a convivência. Há casos em que
esposas de policiais matam seus maridos por ter conseguido acesso a sua
arma de fogo após uma discussão. Policiais que se relacionam com
traficantes de drogas etc.
Um professor financeiramente descontrolado terá que dar aulas a mais
para tentar voltar à estabilidade. Um policial, com arma de fogo à
disposição e investido de sua condição profissional, com todas suas
prerrogativas, terá tentações muito mais perversas para complementar sua
renda. Certamente, esta não é a única fonte de corrupção de um
policial, mas é imprescindível procurar gastar pouco para precisar de
pouco, pois as soluções que aparecerão para seus problemas financeiros
podem lhe gerar problemas judiciais e vitais. Mesmo com o geralmente
parco salário, é preciso se manter na honestidade.
Nem sempre é possível estar observando tudo que está a sua volta.
Existem momentos de relaxamento natural do corpo e do raciocínio. Mas o
policial não pode se descuidar excessivamente, ou corre o risco de
sofrer represálias em decorrência do seu exercício profissional. Se
possui o hábito de portar arma de fogo, esta máxima é ainda mais
pertinente. Entrou em um ônibus coletivo? Sentou em uma mesa de bar?
Está sacando dinheiro no banco? Esteja sempre atento.
O policial geralmente se torna uma referência para a segurança da
comunidade em que reside. Assalto nas proximidades? Pede ao policial
para resolver. Arrombamento em uma casa? Chama o policial para entrar e
ver se há alguém suspeito no interior da residência. Esta “utilidade”,
porém, acaba levando o policial a se considerar um xerife de rua, uma
espécie de ordenador abusivo de qualquer problema que surja em sua
comunidade: algo que levará seus próprios vizinhos a se incomodarem com a
postura. As “milícias” são uma extensão desse papel irregular de
ditador exercido por um policial.
É comum ver policiais que se envolvem em ocorrências policiais fora
de serviço como se de serviço estivessem – como se estivesse na
companhia de uma guarnição, com rádio comunicador para requisitar apoio,
fardado etc. Outros, fardados e de serviço, excedem suas competências e
os limites legais, e abusam do poder que lhes é atribuído. Para ser
policial é preciso exercer permanentemente a humildade e a discrição. A
arrogância e a petulância podem ser fatais.
Pouca profissões são tão estressantes quanto a atividade
profissional. Por isso, se dedicar ao trabalho policial sem ter
atividades secundárias de relaxamento e diversão é um tiro no pé, que
certamente trará problemas para a saúde. Participe de atividades sociais
não policiais, leia livros, assista filmes, jogue futebol, viaje,
enfim, pratique atividades que lhe façam se despir da condição formal e
tensa que a polícia nos impõe.
É verdade que as polícias não treinam adequadamente seus policiais.
Por isso, precisamos nos pronunciar sempre sobre estas carências,
pressionar para que a zona de conforto dos responsáveis por dotar os
policiais de treinamento não se extenda. Enquanto esta deficiência está
ocorrendo, porém, é preciso não descuidar do preparo técnico, mesmo que
isso gere custos particulares. Erra consigo mesmo quem não treina por
“birra” com a polícia. Não é o governador que enfrentará situações de
risco nas ruas. Estar apto para o serviço policial é diminuir os riscos
de morte durante a atividade.
Uma coisa é querer fazer o mal. Outra é estar em um ambiente onde
alguns elementos lhe levam a cometer um mal. Não são raras as ocasiões
em que policiais tidos como pacíficos e moderados acabam se deixando
levar pelas circunstâncias da ocorrência, se envolvendo com os fatos, e
chegam a abusar do uso da força. O controle das emoções é um dos grandes
desafios da atividade policial, e deve ser exercitado cotidianamente,
sob pena do policial se tornar uma “bomba” a explodir suas emoções
sempre que se depara com ocorrências provocativas.
Com todas essas limitações e cuidados que o policial precisa ter,
fica claro porque se justifica qualquer reivindicação de valorização e
reconhecimento dos profissionais de segurança pública.
Autor: Danillo Ferreira - Tenente da Polícia Militar , associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública e graduando em Filosofia pela UEFS-BA. | Contato: abordagempolicial@gmail.com
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